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O que não caracteriza acúmulo de funções

O ajuizamento de reclamatórias trabalhistas pleiteando aumento salarial por acúmulo de funções tem sido visto com certa frequência na Justiça do Trabalho. Na maioria dos casos, o empregado executava, além das tarefas inerentes à função expressamente contratada, outras atinentes à função diversa.

Com efeito, embora não haja expressa previsão legal, existem decisões que atribuem um percentual determinado sobre o salário, geralmente não mais do que 20%, quando efetivamente configurado o acúmulo de funções. Todavia, a mera acumulação de algumas tarefas não dá ensejo ao acréscimo de salário quando não se exige trabalho além das forças do empregado, conforme será discorrido a seguir.

Ao empregador, foi conferido o poder diretivo e cabe ao mesmo atribuir tarefas aos seus subordinados, sendo necessário apenas que sejam respeitadas suas condições pessoais, sob pena de sobrecarga, somente sendo devido pagamento de aumento salarial se esta for comprovada, ou seja, se o empregado de fato desempenha atividades além da sua capacidade laborativa.

Nesse sentido, não há que se falar em acúmulo de funções quando a atividade supostamente acumulada é de menor complexidade e não exige esforço além da capacidade laborativa do empregado. Para isso, existe previsão expressa no art. 456, parágrafo único, da CLT, abaixo transcrito:

Art. 456. A prova do contrato individual do trabalho será feita pelas anotações constantes da carteira profissional ou por instrumento escrito e suprida por todos os meios permitidos em direito.

Parágrafo único. A falta de prova ou inexistindo cláusula expressa e tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal.

Portanto, o simples fato de o empregado exercer várias atividades não acarreta o direito a aumento salarial, desde que os serviços prestados se desenvolvam no mesmo horário de trabalho e para o mesmo empregador, sobretudo porque a maioria dos trabalhadores é remunerada por unidade de tempo (jornada de trabalho normal de 8h diárias e 44h semanais) e não por produtividade/função executada.

Com esse entendimento, vejamos a jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região acerca da necessária complexidade superior para a caracterização do acúmulo de funções:

RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELA RECLAMANTE

ACÚMULO DE FUNÇÃO. As tarefas que fizerem parte da rotina de trabalho presumem-se inseridas no contrato e na remuneração originalmente ajustados, sendo devido o acréscimo salarial por acúmulo de função somente quando comprovado o desempenho, durante a jornada, de tarefas não compreendidas no ajuste inicial e que tenham exigido do empregado maior esforço e/ou qualificação. Aplicação do artigo 456, parágrafo único, da CLT. Recurso desprovido (TRT da 4ª Região, 1ª Turma, 0020378-60.2018.5.04.0211 ROT, em 15/05/2020, Desembargadora Simone Maria Nunes).

ACÚMULO DE FUNÇÃO. DIFERENÇAS SALARIAIS. Nos termos do parágrafo único do artigo 456 da CLT, o empregador poderá exigir do empregado o cumprimento de qualquer atividade lícita, desde que compatível com as atribuições decorrentes do contrato de trabalho e dentro da jornada normal de trabalho, sem que isso gere direito ao pagamento de “plus” salarial (Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Processo: 0020217 -75.2019.5.04.0741 (ROT). Relator: JOAO PEDRO SILVESTRIN. Órgão julgador: 7ª Turma. Data: 23/09/2019).

Outro fator que impede a caracterização do acúmulo de funções, e consequentemente o aumento salarial pretendido pelo trabalhador, é a falta de novação contratual objetiva, termo utilizado para identificar a circunstância de ter executado determinadas tarefas no início do contrato e, no decorrer da prestação de serviços, após passado determinado tempo, passar a acumular outras atividades. Em outras palavras, não há que se falar em acúmulo de funções se o trabalhador executa as mesmas atividades desde o início do contrato, afinal não haveria um acúmulo, já que as tarefas sempre foram as mesmas.

Por:

Rodrigo Aguiar – OAB/RS 96.904

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